EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA
- Lauce Noriyo
- 23 de out. de 2018
- 15 min de leitura
Atualizado: 24 de jun. de 2019
Recuperação histórica da rede federal de educação profissional
Ao falarmos de educação profissional e tecnológica é notória a percepção que essa modalidade apresenta suas próprias características. Isso se deve a trajetória histórica que a EPT e o ensino estiveram condicionados.
Segundo Machado, et al (2016) dentre os condicionamentos os quais a EPT perpassou é relevante destacar a ‘’internalização’’ dos padrões de reprodução do capital dominantes em termos mundiais por meio de modelo socioeconômicos nacionalmente estabelecidos, bem como os pactos das elites vigentes. Nesse sentido foi posto diretrizes incoerentes que conduziram a EPT aos moldes das elites políticas dominantes.
Voltado em delinear a configuração estrutural que a EPT construiu ao longa da história, realizaremos um recorte histórico que compreende desde a educação profissional e tecnológica precedente a 1930 no Brasil e os tempos atuais.
Moura (2007) relata a função primordial da educação profissional até o século XIX limitada a reprodução das classes dominantes. Contudo nos primeiros achados citados no século XIX o autor afirma ’’ A educação profissional no Brasil tem, portanto, a sua origem dentro de uma perspectiva assistencialista com o objetivo de amparar os órfãos e os demais desvalidos da sorte”, ou seja, de atender àqueles que não tinham condições sociais satisfatórias, para que não continuassem a praticar ações que estavam na contraordem dos bons costumes’’. É harmonioso a função assistencial que a educação profissional assumiu, visto que em termos sociais a sociedade de origem escravocrata, de culturas heterogênea influenciada pela coroa portuguesa e ampla diversidade cultural.
No início do século XX, tendo a Inglaterra como grande centro hegemônico industrial, financeiro e comercial notamos um protótipo concorrencial liberal de reprodução do capital. Esse modelo realçava a ausência de um modo de regulação social que normatizasse a relação trabalho-capital. Em termos nacionais a reprodução do capital resultou em modelo socioeconômico agroexportador reorganizado aos moldes capitalistas. Essas influências estimularam, dentro de seus limites, a uma formação societal consubstanciada nos processos de urbanização, industrialização e restruturação, configurando uma nova ordem social.
Merece destaque o início do século XX o fato das influências socioeconômicas proporcionarem uma maior preocupação com a educação profissional. Moura (2007) enfatiza o esforço público de organização da formação profissional, modificando a preocupação em perpassar o caráter assistencialista da preparação de operários para o exercício profissional. Evidentemente a relação trabalho e educação se aproxima e percebemos um viés econômico nessa relação. A consolidação de uma política de incentivo para preparação de ofícios e atendimento de necessidades emergentes dos empreendimentos nos campos da agricultura e da indústria.
Nesse contexto chegamos a década de 1930 com uma estrutura educacional de educação básica dual com percursos formativos diferenciados entre os filhos das elites e os filhos das classes trabalhadora. Havia um curso primário com duração de 4 anos para aqueles cujo percurso tinha como fim a educação superior. Alternativamente, existiam os cursos rural ou profissional destinado às crianças das classes populares (KUENZER, 1997).
Paralelamente a essa estrutura educacional, processaram-se a crise do padrão concorrencial-liberal de reprodução do capital com uma consequente transição para o padrão fordista-keynesiano. O processo de estruturação do sistema EPT, de organização da rede de escolas profissionalizantes da união e reconfiguração das instituições que constituíam essa rede foi consolidado por meio do Decreto-Lei n.4.073/1942, que estabeleceu a Lei Orgânica para ensino Industrial. (MACEDO,2016).
Inicia-se assim uma rede de instituições direcionadas para o ensino profissional, com o propósito de compor a força de trabalho demandada pelo setor produtivo. A função social das instituições de ensino já não interessava somente a formação das elites para ocupar os cargos da administração e da política, mas também dos recursos humanos necessários pares atender aos imperativos de uma economia em formação.
Consubstanciado no padrão fordista-keynesiano de reprodução do capital, sob a hegemonia industrial e comercial dos Estados Unidos, com a crescente industrialização de países de desenvolvimento capitalista periférico, a EPT ocupou o centro do debate das políticas institucionais, foram conduzidas formas de regular essa modalidade e produzir uma significativa reestruturação do sistema de ensino nacional. Percebe-se que essa demanda decorrente do processo de industrialização foi fortemente potencializada pela 2° guerra mundial, período esse que as grandes economias concentravam seus esforços nas industrias bélicas e permitiam a abertura de mercado as economias emergentes avançassem em seus processos de industrialização.
Em virtude de uma organização diferenciada que a educação profissional apresentava, sendo incumbência tanto da iniciativa privada como pública, com intuito de regulamentar e organizar o sistema de ensino brasileiro damos destaque a um conjunto de decretos denominados Leis Orgânicas da Educação nacional, também chamada de Reforma Capanema, por ser conduzida pelo então Ministro da educação Gustavo Capanema. Reforma esta que redefiniu currículos e a articulação entre cursos, ramos, ciclos e Graus. Essa reforma legitimou a separação entre trabalho manual e trabalho Intelectual. De acordo com Kuenzer (1997), reafirmava-se a dualidade visto que o modelo promovia o acesso ao ensino superior, via processo seletivo, cujo o domínio de conteúdos gerais, das letras, das ciências e das humanidades era necessário e considerado como válidos para formação da classe dirigente.
Assim sendo, a educação brasileira denominada regular, ficava estruturada em dois níveis, a educação básica e a superior. A básica divide-se em duas etapas. O curso primário, com duração de 5 anos e o secundário, subdividido em ginasial, com duração de 4 anos, e o colegial, com 3 anos. A vertente profissionalizante parte final do ensino secundário era constituída pelos cursos normal, industrial técnico, comercial técnico e agrotécnico. Todos com mesmo nível e duração colegial, entretanto não habilitava para o ingresso no ensino superior. Também vale ressaltar que a criação do SENAI, em 1942, seguida do SENAC, em 1946, revê dos demais sistemas ao longo desse período, revelam a opção governamental de repassar a iniciativa privada a tarefa de preparar mão-de-obra para o mundo produtivo. (MOURA, 2007)
As referidas leis orgânicas conduziram a educação nacional de fato até a sofrer algumas modificações em 1961, quando é aprovada a Lei de Diretrizes e Bases 4.024/61.O período que antecedeu a vigência dessa lei foi de grande efervescência, discussões, debates e conflito entre modelos distintos de desenvolvimento, posto que o projeto de lei começou a tramitar em 1948, uma fase de redemocratização do país pós Estado novo. Em torno dessas discussões a referida lei entrou em vigor em 1961 e permite um articulação completa entre os ensinos secundários e profissional, numa tentativa de resolver uma das principais contradições, concedendo o ingresso em qualquer curso superior para qualquer aluno que estivesse concluído o ramo secundário ou profissional e além disso, estender ao SENAI a mesma organização que estava prevista no sistema público de ensino.(SANTOS, 2007, p. 218-219).
Em termo essa concessão não oportunizou um total rompimento da dualidade. Segundo Kuenzer (2007, p.15) o cerne da dualidade se encontra nos projetos pedagógicos distintos, sendo a essência do princípio educativo tradicional a divisão técnica e social do trabalho de formar trabalhadores instrumentais e trabalhadores intelectuais.
Em termos de atendimento ao mercado podemos inferir que a história nos demonstra que a educação profissional passou a ter grande importância de conceder a este as ferramentas e mãos de obras necessárias para produção necessária. Isso se evidenciou com força durante o governo militar, em 1964, Niskier(1974, p.19), exemplifica isso de forma clara, ‘’ a meta a ser alcançada é a de transformação do Brasil numa grande potência, no espaço de uma geração, através do que se constitui o modelo brasileiro do desenvolvimento’’, por meio da Lei 5.692/71, instituiu a profissionalização compulsória, isto é, o antigo 2 grau deveria ser profissionalizante. A Essa nova estrutura atingiu, principalmente, a educação e grau primário e grau médio, especificamente os denominados primário, ginásio e colegial, definidos pela Lei n° 4.024/61, os quais passaram a ser chamados de 1° grau (primário e ginásio) e 2° grau(colegial). Alguns avanços podem ser evidenciados nesse período, com destaque para a elevação do grau de escolarização mínima da população e a extinção do exame de admissão ao ginásio. Tal caráter de profissionalização dado ao ensino de 2° grau de maneira compulsória decorre diretamente da necessidade de consolidar uma economia que objetivava participar em termos reais de uma economia em aspecto internacional e alavancar o desenvolvimento com base imposição de uma ideologia de um governo autoritário. O sistema de educacional assume essa função claramente durante o governo militar.
Em termos reais a Lei 5.692/71 conduziu os rumos da educação até nova LDB em 1996, com pequenas alterações produzidas pela Lei7.044/82, o qual mudou o termo ‘’qualificação para o trabalho’’ para ‘’preparação no trabalho’’, facultando a obrigatoriedade da profissionalização em todo o ensino de 2° grau. Contudo na prática a velha dualidade permanecia. De fato, as alterações reais foram instituídas com as reformas do ensino profissionalizante conduzidas pela Lei 9394/96 e o decreto federal 2208/97. Essas novas legislações surgem dentro de um contexto de redemocratização, propondo diferentes caminhos para a educação nacional. Similar a construção a LDB, o país acabara de sair de um período ditatorial numa tentativa de reerguer o estado de direito. Nesse cenário as disputas em torno de projetos societárias ficaram mais evidentes e refletiam claramente nos rumos da educação nacional. Os conflitos eminentes se deram em torno dos modelos de educação que buscavam uma educação democrática, pública e de qualidade e o modelo tradicional que defendia a permanência de uma educação voltada para mercado, baseado em argumentos de ineficiência e baixa qualidade da educação ofertada pelo estado.
Nesse conflito, prevaleceu a força da lógica de mercado, incorporando um padrão flexível-neoliberal de reprodução do capital, com a possibilidade de livre atuação da iniciativa privada em todos os níveis da educação, conforme já vinha sendo garantido na Constituição Federal de 1988 e na Lei de diretrizes e bases de 1996. Em analise as respectivas legislações balancearam as disputas de projetos sociais ali abarcadas. Consubstanciada nessas disputas, conduzidas desde 1988, verificamos que ainda persistiu a dualidade entre ensino geral e profissional. Dualidade essa cujo decreto 2.208/97 salientou. Esse decreto regulamentou o § 2° do artigo 36 e os artigos 39 a 42 da nova LDB, referentes á educação profissional, que estabelece os seguintes níveis: básico, que se destina a qualificação e reprofissionalização de trabalhadores, independente de escolaridade prévia; técnico, destinado a proporcionar habilitação profissional a alunos matriculados ou egressos do ensino médio; tecnológico, correspondente a cursos de nível superior na área tecnológica, destinados de ensino médio e técnico (SANTOS, 2007, p.222).
Efetivamente a separação entre ensino técnico e ensino médio foi de caráter proibitivo, isto é, o aluno do ensino técnico somente poderia cursar o ensino médio separadamente(concomitante) ou posteriormente(subsequente), com o fim de estimular a juventude a se interessar por uma formação profissional que lhe proporcionasse empregabilidade imediata. Dessa forma configurava-se uma perspectiva fragmentada de EPT, imediatamente dirigida ao mercado e separada (mas podendo ser articulada) da educação regular (MACEDO, 2016).
Alicerçado nos discursos de globalização e na perspectiva neoliberal, tais reformas posicionaram a educação profissional como uma modalidade estratégica para ao atendimento das demandas relacionadas aos avanços tecnológicos e a estruturação do trabalho. Em termos gerais o mercado de trabalho passou a ser incorporado como princípio regulador da atividade profissional, influenciando no currículo, na didática e no planejamento metodológico.
Avançando nessa trajetória histórica, abarcamos as transformações ocorridas com a mudança de governo, a ascensão ao poder do governo Lula, promovendo a inserção de novas políticas públicas e diretrizes para o sistema educacional. Consoante á necessidade de o governo comprometer-se com os anseios e apelo popular, no sentido de suprimir instrumentos voltados ao interesse do mercado em detrimento da formação integral do ser humano. A primeira iniciativa desse projeto de governo foi revogar o Decreto 2.208/97 e publicação de uma nova proposta de educação profissional técnica de nível médio, por meio do Decreto 5.154/04. Nessa nova orientação para organização da EPT, o debate teórico travado pela comunidade educacional, especialmente entre aqueles que investigavam a relação entre o trabalho e a educação. Afirmava a necessária vinculação da educação á prática social e o trabalho como princípio educativo (FRIGOTTO; CIAVATA, RAMOS, 2012, p.35). Essa nova vertente traz princípios e diretrizes do ensino médio integrado á educação profissional, num esforço de superar a dicotomia entre conhecimentos específicos e gerais, prevendo a possibilidade de integração entre educação profissional e propedêutica. Contudo, manteve-se a forma de oferta concomitante e subsequente prevista no decreto revogado e o paralelo funcionamento de redes de ensino distintas. Frigotto, Ciavata e Ramos (2012) reiteram que:
O conteúdo final do Decreto n°5.154/04, por outro lado sinaliza a persistência de forças conservadoras no manejo do poder de manutenção de seus interesses. Mas também pode revelar a timidez política do governo na direção de um projeto nacional de desenvolvimento popular e de massa, cujo corte exige reformas estruturais concomitantes, como sinaliza Márcio Pochmann*, insistentemente, com políticas distributivas e emancipatórias. (p. 52).
Há de se reconhecer que as expectativas em uma apropriação de maior vulto no âmbito do trabalho e educação, principalmente pelas contradições construídas em torno da educação profissional, foram frustradas revelando um percurso controvertido entre as lutas da sociedade e as propostas e ações de fatos ocorridas no exercício do poder. Muito se justifica essa decepção em virtude da transitoriedade que o decreto 5.154 representou. A tão esperada mobilização pela defesa do ensino médio unitário e politécnico não acontecer nas vias de fato. Pelo contrário, surgiram políticas fragmentadas dentro do próprio MEC, demonstrando que a política de integração não seria prioridade.
Considerando que tal decreto surge em um período de complexa carência do cenário nacional educacional e apesar do novo decreto propor novos caminhos para EPT, principalmente na técnica de nível médio, foi mantido a validade das diretrizes curriculares nacionais para o ensino médio e para a educação profissional, ratificando a política da empregabilidade, da educação por competência estabelecidas mais a frente, persistindo assim o ideários neoliberais. (KUENZER, 2007).
Nesse sentido a política educacional ocasionou importantes decisões no início do ano 2000. A expansão da rede federal alavancou franco crescimento, após a revogação da Lei 9.649/98. A publicação do decreto 5.224 de outubro de 2004, passou a possibilitar aos CEFETs atuarem em todos níveis de educação tecnológica, desde o básico até pós-graduação.
Vale destaque para um dos princípios norteadores de uma política de educação profissional integrada à educação básica foi a regulamentação dos cursos denominados “nível básico” da educação profissional. A oferta desses cursos, como parte da política de educação profissional do governo FHC, procurava atender a demandas por qualificação e requalificação profissional da população adulta de baixa escolaridade por intermédio de uma rede específica de cursos de curta duração, completamente dissociados da educação básica e de um plano de formação continuada. Nesse sentido o Ministério do Trabalho e Emprego desenvolveu seu plano de formação sem se preocupar com a recuperação da escolaridade e a organização de itinerários formativos específicos e aligeirados. Setores importantes presentes na sociedade afirmavam, então, a necessidade de se implementar uma política pública de formação profissional, integrada ao sistema público de emprego e à educação básica.
Dentro dessas orientações a formulação das premissas às quais a educação profissional deveria atender, descritas no Decreto n. 5.154/2004, na qual a organização, por áreas profissionais, em função da estrutura socio ocupacional e tecnológica; e a articulação de esforços das áreas da educação, do trabalho e emprego, e da ciência e tecnologia. O decreto indica a possibilidade de oferta dos cursos e programas de formação inicial e continuada de trabalhadores segundo itinerários formativos, compreendidos como o conjunto de etapas que compõem a organização da educação profissional em uma determinada área, possibilitando o aproveitamento contínuo e articulado dos estudos. Reforça também a necessidade de esses cursos se articularem com a modalidade de educação de jovens e adultos. Assentado nessa base legal , o MEC lançou o Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA compelindo as instituições da rede federal de educação técnica e tecnológica a destinar, em 2006, o correspondente a 10% das vagas oferecidas em 2005 para o ensino médio integrado à educação profissional destinado a jovens acima de 18 anos e adultos que tenham cursado apenas o ensino fundamental. Fica assim a EJA a incumbência residual com a educação básica estratégia voltada a universalização da educação básica.
Vale refletir que diante dessa transitoriedade, distorções se apresentaram como as divulgadas políticas de parceria público-privada do governo federal, com programas voltados a uma inserção no mercado de trabalho atingindo uma desempregados em busca de renda. Nesses programas é transparente, com diferenças na as organizações, finalidade e púbico alvo, retomam preceitos os quais já teriam que estar superado, o qual utiliza a qualificação profissional como meio compensatório a ausência do direito de uma educação básica sólida e de qualidade. (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005)
Por se tratar de um período de grande discussão e reestruturação da educação profissional e tecnológica, é coerente realçar os períodos dos Governos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2010) e de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010). Tendo em vista o que foi produzido em termos de ciência, relação de estado, sociedade e principalmente mercado.
Utilizando a concepção Gramsciano, de estado ampliado, formado pela superestrutura do bloco histórico, constituída pela sociedade civil e sociedade política como conteúdo econômico social, no qual as relações sociais são produzidas e reproduzidas, plenas de contradições e sujeita a conflitos. Denominamos o estado como a expressão das relações ideológicas e culturais da vida espiritual e intelectual que se constituem o centro do debate, capazes de intervir na cultura política, na estratégia dos demais atores, na elaboração de sua própria agenda governamental.
No Brasil, podemos dizer que o padrão neoliberal de desenvolvimento se iniciou em 1980 e foi realmente assentada durante os anos 90. A concepção neoliberal passou a direcionar a política brasileira a partir do governo de Fernando Collor de Mello (1990-1992) e acentuou-se no governo de FHC (1995-2002) por meio de uma série de reformas do Estado, tendo a privatização como um dos eixos centrais. Os pressupostos básicos da reforma do Estado no Brasil, que tem como finalidade intensificar a abertura do mercado para investimentos estrangeiros foi acentuando-se e expandindo até a educação. A política de focalização na área educacional revela-se por meio dos recursos da União, priorizados para o atendimento ao ensino fundamental pela redução dos investimentos públicos nas Instituições de Ensino Superior (IES) públicas, conduzindo-as a conseguir recursos no mercado, e pela criação de bolsas para os estudantes do ensino superior privado.
A educação, bem como toda a área social, sofreu as consequências da redução de recursos no orçamento geral. As políticas desenvolvidas de ajuste estrutural se pautaram na “desregulamentação dos mercados, na abertura comercial e financeira, na privatização do setor público e na redução do Estado” (CHAVES; LIMA; MEDEIROS, 2008, p. 333).
As reformas educacionais propostas e implementadas pelo governo FHC no Brasil buscaram por meio da descentralização administrativa, financeira e pedagógica gerar a ampliação do acesso à educação a partir de uma lógica racional, tendo como paradigma o preceito da economia privada (OLIVEIRA, 2011; DOURADO, 2002).
Frigotto e Ciavatta (2003) consideram que o projeto educativo do governo FHC apresentava certa coerência quando articulado ao projeto de ajuste da sociedade brasileira às demandas da globalização econômica, contudo as necessidades da sociedade organizada foram substituídas por medidas produzidas por segmentos do governo, que impunham políticas de cima para baixo, e de acordo com os princípios do ajuste, reforçando o caráter racional e privatista do projeto.
Se destaca que a proposta de governo de FHC (1995-1998) teve duas grandes linhas de gestão na qual a primeira é focada na educação básica, vista como o elo carente da educação e o ensino superior seria uma vertente de segundo plano e a segunda no rearranjo das atribuições e alcance do governo federal na educação, onde o Ministério da Educação (MEC) assumiria um papel de controle e formulador de políticas.
Nesse contexto o Estado passou a ser o promotor e o regulador do desenvolvimento econômico e social, e não mais o responsável imediato e direto da produção de bens e serviços do desenvolvimento, estabelecendo uma administração pública gerencial, flexível e eficiente, voltada para o atendimento do cidadão.
Tal modelo não conseguiu reproduzir na esfera educacional os princípios de economicidade e eficiência empresariais e ao final do governo FHC, a educação nacional se apresentava fragmentada, segmentada e dispersa, o que não colaborou para instituir bases de cooperação, integração e coesão entre os entes federativos e a sociedade.
A frustação desse modelo neoliberal tardio refletiu a necessidade de mudanças com a consequente vitória das forças políticas e sociais, o que efetivou a resistência ativa à ditadura civil-militar e à ditadura do capital com suas políticas neoliberais, o que levou à demanda de uma inversão de direção do modelo econômico e, consequentemente, nas esferas social e educacional.
Retomando ao Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, de caráter progressista, defendia preceitos de qualidade social da educação, democratização do acesso/garantia da permanência e democratização da gestão educacional. Contudo como já dito não sobressaíram políticas populares em nenhum campo da administração pública. O que prevaleceu foi a continuidade das políticas do governo de FHC, buscando uma melhor governabilidade.
O pilar segundo Oliveira (2009) foi o crescimento do país e a inclusão social por meio de uma educação de qualidade acessível a todos. Essa perspectiva retratou uma ênfase no ensino superior com incentivo à qualidade de educação básica, na alfabetização e na educação profissional.
Tais políticas educacionais ocasionaram uma maior atenção pública e foram sendo reorientadas no sentido de proporcionar avanços para a educação básica, profissional e superior, sobretudo na expansão e garantia de uma educação pública de qualidade, alicerçado nas bases da democratização e inclusão.
Várias ações foram empreendidas, influenciadas pela garantia pública de qualidade e alicerçadas nas bases de democratização e inclusão, voltadas a educação básica. A qualidade foi parâmetro norteador das diretrizes, metas e ações, em uma dimensão sócio histórica. Ao assumir o compromisso com a qualidade social da educação essa gestão propôs garantir uma eficiência, eficácia e efetividade social, controversa aos princípios da gestão anterior, fundadas nas teorias empresarias, buscou-se contribuir com a melhoria da aprendizagem dos educandos e abordando aspectos relativos a condições de vida e formação cultural da população.
Em paralelo o movimento privatista continuou seguindo a lógica da racionalidade gerencial capitalista e privada do aparelho do Estado proposto por FHC. Esse movimento se traduziu na acentuação da dimensão privado/mercantil com sua racionalidade organizativa, mas sob novo enfoque, se pautando em um discurso que alega expansão do ensino superior com justiça social através do acesso de setores tradicionalmente excluídos da educação superior.
Depreende-se que o governo Lula avançou, em relação aos governos anteriores, ao enfocar a inclusão social, com ênfase à educação. Além de garantir o acesso à escola, a permanência e o bom rendimento também foram objetivos dessa gestão, garantir uma educação básica obrigatória e com qualidade, e assegura a continuidade do processo de expansão das matrículas no ensino superior. Houve alteração do ensino fundamental de oito para nove anos (Lei n. 11.274/2006), aumento de verbas para as escolas, criação do Fundeb, em substituição do Fundef, e a ênfase à avaliação da educação foi explicitada por meio da criação da Prova Brasil, da Provinha Brasil, do Censo Escolar da Educação Básica, e com a continuidade do Saeb e do Enem (este último reformulado e ampliado). Além disso, vale ressaltar a aprovação do PDE em 2007. Assim, as políticas educacionais do governo Lula nos seus dois mandatos podem ser caracterizadas por políticas ambivalentes que apresentam rupturas e permanências em relação às políticas anteriores. Ao mesmo tempo em que se assiste, na matéria educativa, à tentativa de resgate de direitos e garantias estabelecidos na Constituição Federal de 1988.
Diante do que foi colocado, podemos analisar que o período que compreende os governos FHC e Lula foi marcado por rupturas e continuidades, mas é inquestionável que houve intencionalidade na busca pelo acesso e permanência na educação básica e pela expansão do ensino superior.
Em termos numéricos o governo FHC procurou melhorar os índices de alunos matriculados nas escolas de ensino fundamental, e disseminou a cultura da avaliação na perspectiva de constituir o Estado Avaliador. O governo Lula, por sua vez, interviu nesse nível de ensino com o objetivo de não apenas garantir o acesso à escola, para a população, mas também assegurar a sua permanência, além de ampliar o ensino fundamental para nove anos. Além disso, aumentou o financiamento, reformulou e criou formas de avaliação em larga escala, na busca pela qualidade da educação básica.
É notável o esforço dos dois governos para universalizar o ensino fundamental, mesmo que segundo diferentes lógicas, concepções e programas. Ambos assumiram o compromisso de inserir crianças na escola. E no que se refere à educação superior, buscou-se “naturalizar a inexistência da contraposição entre os planos públicos e privados; a defesa do papel do Estado como regulador e controlador da prestação de contas das IES; a ciência e o conhecimento a serviço da economia, dentre outros” (FERREIRA, 2012, p. 465).
Cara Lucas. Dentre os avanços e retrocessos que a EPT perpassou visualizo um momento crítico de ataque a uma formação integral , com previsão de retrocesso nas conquistas históricas.
Interessante análise que você faz. É importante conhecer o caminho percorrido para compreendermos a atual conjuntura. Por isso mesmo, tenho um questionamento: para que rumos, no atual contexto político, você acredita que vamos caminhar?
A falta de um Plano Nacional de Educação e sua implementação pelo Estado cobra seu preço. À rigor, o país ainda não conseguiu fazer da Educação um tema de Estado, apenas de governos que vão e voltam. As contradições e os cenários em disputa na EPT nos governos Lula e Dilma que precisavam agradar os grandes empresários da Educação, o Sistema S e a aposta em programas apenas marqueteiros como o Pátria Educadora ou o PRONATEC contribuiram para estado de desorganização e falta de projeto educacional estatal.