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Gestão Democrática, descentralização e autonomia

  • Foto do escritor: Lauce Noriyo
    Lauce Noriyo
  • 30 de abr. de 2019
  • 5 min de leitura

Muito embora as concepções de descentralização, democratização da gestão escolar e autonomia da escola sejam parte de um mesmo conjunto, encontramos certos sistemas que buscam o desenvolvimento da democratização da gestão escolar, sem pensar na autonomia do estabelecimento de ensino e sem descentralizar poder para a mesma. Essa prática de alguns sistemas de ensino, no sentido de desenvolver nas escolas os conceitos de democratização e autonomia, de modo centralizado, implica uma contradição paradigmática muito comum, que faz com que os esforços se anulem. Isso porque é comum a prática de se incentivar a promoção de mudanças de cima para baixo, na base hierarquia funcional, de modo que a mudança pretendida é proposta para a escola, não sendo absorvida e praticada por quem a propõe. Em vista disso, sendo implantada linearmente e contrariamente ao seu espírito e propósitos estabelecidos. (Lück, 1985)

Cabe nesse momento discorrer um pouco sobre essas três vertentes a fim de esclarecer pontos obscuros no que tange a gestão democrática.

A descentralização advém como prática voltada a promover uma gestão mais concreta em atendimento as reinvindicações democráticas. Essa descentralização possibilita os gestores locais promover uma maior gestão de processos e recursos e aliviar organismos centrais que se tornam muitas vezes sobrecarregados. Contudo ainda percebemos traços patrimonialistas em alguns sistemas de ensino que insistem na centralização, isto é, dando um espaço com uma mão, ao mesmo tempo que tirando outro espaço, com outra, pode-se concluir que o princípio que adotam não é o da democratização, mas o de maior racionalidade no emprego de recursos e o de busca de maior rapidez na solução dos problemas.

Mais uma vez nos deparamos com práticas oriundas de construções históricas que possuímos. Essas práticas se confundem com o caráter heterogêneo que nossa sociedade possui e com a grande dificuldade de comunicação e as distâncias que nosso território apresenta. Tal complexidade revela esse caráter controlador a nível central de difícil superação. Isso proporcional um cenário que se aproxima mais de desconcentração do que descentralização.

Segundo Florestal e Cooper (1997):

Desconcentração é ato de conferir autoridade a um agente situado em um nível inferior na mesma hierarquia e localizado mais próximo dos usuários do serviço, com o entendimento de que esses agentes se mantêm sob o controle hierárquico do governo central. (p. 32)

Nesse sentido, precisar os conceitos de descentralização e desconcentração pode ser resumida na premissa que afirmar que o primeiro se trata de um processo que visa assegurar a eficiência do poder local e o segundo, um processo que visa assegurar a eficiência do poder central, o que configura um movimento de cima para baixo.

A descentralização parte de uma mudança nas relações entre os sistemas, aonde os órgãos centrais deixam de exercer o controle e o comando e passam a atuar na coordenação e orientação, consistindo em uma descentralização política. A descentralização administrativa e financeira carece de liberdade de autodeterminação no estabelecimento de processos e mecanismos de gestão cotidiano escolar e da relação destes com a comunidade. (MALPICA,1994)

Muito se discute a questão de descentralização em sentido macro, abordando a descentralização de esfera federal para o governo estadual e deste para os municípios. Contudo tal descentralização ainda aborda em sentido micro a própria esfera federal e suas autarquias. Sendo mais específico dentro das próprias instituições ensino. Detalhando a nível de educação profissional e tecnológica, é necessário um olhar mais atento na descentralização visto que as instituições ensino profissional e tecnológica ainda buscam afirmar características democráticas e estas abordam aspectos como a descentralização pedagógica, política e administrativa. Em mera comparação as reitorias e Pró-Reitorias assumem a posição de órgão central detentoras de poder, enquanto os câmpus reivindicam a descentralização como expectativa de assumir um papel democrático sob a coordenação central.

O ponto mais discutido e talvez relevante da gestão democrática seja a questão da autonomia. Isso se dá em virtude de o conceito ser o mais mencionado nos programas de gestão promovidos pelos sistemas estaduais de ensino, como também em programas do Ministério de Educação, uma vez que neles está presente, como condição para realizar o princípio constitucional de democratização da gestão escolar.

No mundo globalizado que estamos vivendo exige ações rápidas, mudanças urgentes e consistentes, que respondam com qualidade as necessidades que sociedade impõe. Nesse contexto a autonomia se faz como necessidade. Tomar decisões rápidas carece que os responsáveis locais tenham segurança e condições de exercer essa autonomia com comprometimento e respeito aos desejos coletivos.

É preciso refletir sobre o conceito de autonomia para que concepções conflitantes estão sendo expressas gerando desentendimento e confusão sobre a questão desarticulação de ações e de propósitos.

Segundo o Dicionário Básico da Língua Portuguesa (Ferreira, 1995), autonomia é ‘’a capacidade de resolver seus próprios problemas.’’. Contudo muito se confunde autonomia com descentralização de recursos. Isso se torna um equivoco a partir do momento que muitas vezes regulamentos e normas consubstanciadas em diretrizes de qualidade e resultado impedem que esse recurso seja gerido conforme ás reais necessidades da instituição. Esse controle que advém de cima para baixo amarra a autonomia a condições já pré-existentes, cabendo aos responsáveis a nível local somente a mera distribuição e não atendimento das condições esperadas pela comunidade, que vive o cotidiano escolar e conhece suas carências.

Essa definição de dicionário se torna muito supérflua para o entendimento da autonomia escolar. A dinâmica de instituições de ensino evidência uma interdependência entre os níveis centrais e locais. Se assemelha a uma avenida de mão dupla, onde tanto o órgão central como o local carecem dessa relação entre ambas. A construção coletiva proposta dentro de uma gestão democrática não condiz com separação total dos dois níveis. O funcionamento e solução de problemas consiste na ampliação dos espaços de discussão e de decisão. Nos âmbitos é que a escola constrói a sua autonomia, sendo esta caracterizada, portanto, pela fluidez, em acordo com as tendências e forças do momento.

Portanto não podemos resumir a autonomia a descentralização de recursos financeiros, mas sim a questão política envolvida na tomada de decisões compartilhadas e comprometidas, a questão financeira é somente um meio e não um fim.

Para a prática da autonomia escolar, alguns mecanismos são explicitados: existência de estrutura de gestão colegiada, que garante a gestão compartilhada; a eleição de diretores e a ação em torno de um projeto político-pedagógico.

Nesse estudo abordaremos à estrutura de gestão colegiada, visto que o próprio Ministério da Educação (MEC) orientou a organização dessas estruturas, com o objetivo de sistematizar e ordenar a formação desses mecanismos de gestão, denominando-os genericamente como Unidade Executora, cuja responsabilidade precípua seria a de receber, executar e gerir recursos financeiros da unidade escolar. Brasil (1997) reforça:

A Unidade Executora é uma denominação genérica, adotada para referir-se às diversas nomenclaturas, encontradas em todo território nacional para designar entidade de direito privado, sem fins lucrativos, vinculados à escola, tendo como objetivo a gestão dos recursos financeiros, transferidos para a manutenção e desenvolvimento do ensino. Não importa qual a denominação que a unidade escolar e a comunidade escolham para a Unidade Executora, seja ela Associação, Caixa Escolar, Círculo de Pais e outras. O princípio básico é a busca da promoção da autonomia da escola e participação da comunidade, em todas as suas dimensões: pedagógica, administrativa e financeira. (p.11)

Em uma analogia percebemos que a unidade gestora em uma instituição de educação profissional e tecnológica é constituída pelos conselhos constituídos cuja atribuição deliberativa lhe concebe.

Por fim podemos definir que autonomia é uma série de características. Autonomia é um processo que se constrói no cotidiano mediante a superação de contradições, associação e interdependência entre os âmbitos micro e macro, consideração ao contexto real, compartilhamento de responsabilidades e constantes processo de mediação. Todas essas características em conjunto implicam uma autonomia com bases democráticas.

A tendência democrática, intrinsicamente, não pode consistir apenas em que um operário manual se torne qualificado, mas em que cada ‘’cidadão’’ posa se tornar ‘’governante’’ e que a sociedade o coloque, ainda que abstratamente, nas condições gerais de poder fazê-lo. (GRAMSCI, 1978b, p.137)

 
 
 

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2 Comments


reigiany.silva40
Jun 26, 2019

O principal passo para que a gestão democrática se instale na instituição escolar é pela definição de espaços que permitam a participação da comunidade externa e/ou comunidade civil no interior da escola, para que possam contribuir com a consciência democrática.

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Giovani Comerlatto
Jun 25, 2019

Assim como a palavra liberdade conduz à uma crença idílica que podemos fazer qualquer coisa, a palavra autonomia dentro da gestão pública também possui amarras legais para a sua viabilidade. Entretanto, parece haver um movimento da própria gestão governamental em restringir a autonomia de ação das unidades gestoras em nome de uma falsa predestinação "correta" de esforços e finanças. Exemplo disso é a questão das rubricas financeiras, que exclui qualquer possibilidade do executor afastar-se daqueles parâmetros não autônomos.

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